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O falcão-peregrino nas cidades
Por: Willian Menq | 25 de fevereiro de 2015
 
 


Falcão-peregrino em Maringá/PR. Foto: Willian Menq

Todos os anos, normalmente entre os meses de setembro e outubro, aparece em nosso país uma das mais populares e impressionantes espécies de falcão: o falcão-peregrino (Falco peregrinus). Com seus 50 cm de comprimento e 1 a 1.5 kg, o falcão-peregrino pode ser considerado o protótipo do predador de aves, velocidade e imponência estão reunidas numa constituição física que faz deste falcão um incontestável dominador dos céus. Ele migra da América do Norte, fugindo do frio, aparecendo em diversas regiões da América do Sul, inclusive por todo o Brasil.

Quando chegam? Quando voltam?
A partir do fim de setembro os peregrinos começam a aparecer em território brasileiro. De acordo com Drummond (2010) o grande pico de chegada dos falcões já nos seus sítios regulares de invernagem ocorre no fim de outubro, entre os 10 últimos dias do mês e as primeiras semanas de novembro, mas principalmente no final de outubro. No norte e nordeste do Brasil, em setembro e na primeira quinzena de outubro podem ser observados alguns falcões, mas geralmente são indivíduos que estão adotando "stopover", que são paradas de pouso temporário para se alimentarem e descansarem antes de chegarem ao destino final. O tempo médio da viajem de migração dos falcões-peregrinos que vêm dos pontos mais distantes como do norte do Canadá, Ártico, Alasca e Groenlândia até chegarem à América do Sul é de aproximadamente 30 a 40 dias, o tempo de volta é basicamente o mesmo.

Em nosso país, os falcões permanecem até o mês de março e inicio de abril; é entre a primeira e segunda semana de abril o período mais comum deles retornarem para a América do Norte. Praticamente todos os estados recebem falcões-peregrinos, os que parecem ter a menor frequência de ocorrência é Mato Grosso, Goiás e os estados da região norte, talvez a baixa frequência de registros se deve ao baixo numero de observadores destes locais.

Adaptação ao estilo de vida urbano
No ambiente urbano, a grande concentração de pombos-domésticos, pardais e outras aves, atraídas por restos de comida, torna-se um atrativo interessante para o falcão. Por isso, é comum a presença do falcão-peregrino nos grandes centros urbanos e nas cidades costeiras. Outro atrativo muito presente nas cidades, é a existência de grandes arranha-céus, edifícios e prédios altos que lembram os desfiladeiros e penhascos naturais usados pelo falcão como poleiro estratégico de caça.

Captura suas presas em voo, através de impressionantes perseguições. Usa os poleiros do alto de edifícios e antenas de telefonia para avistar suas presas em voo e se atirar sobre elas. Outra estratégia de caça interessante consiste em subir nas correntes de ar quente (térmicas) a grande altura, deixando-se então cair sobre a presa avistada, num ângulo mais ou menos pronunciado e por vezes em queda livre vertical, com as asas aerodinamicamente coladas ao corpo, e controlando magistralmente a sua velocidade, alcançando velocidades incríveis, às vezes descendo a mais de 250 km/h. Este tipo de caça, apesar de ser o mais impressionante, é o menos utilizado por esse falcão, não sendo tão eficiente quanto o método de perseguição (Sick, 1997).

De forma geral, o falcão-peregrino se alimenta de qualquer ave menor ou do seu próprio tamanho (e às vezes até maior). Nas cidades, além dos pombos, os indivíduos que vivem em regiões costeiras costumam predar aves marinhas, como andorinhas-do-mar. Podem também caçar morcegos, principalmente os morcegos-de-cauda-livre (molossídeos), que voam alto de forma retilínea em áreas abertas, antes mesmo do crepúsculo, e acabam se tornando presas fáceis, já que esses morcegos tem dificuldade para perceber a presença dos falcões no seu encalço.

Com edifícios altos que oferecem poleiros de caça e descanso e grande presença de pombos que garantem um amplo suprimento alimentar, não é de se surpreender que os falcões-peregrinos prefiram as cidades do que o campo. Além disso, a iluminação artificial das cidades tem proporcionado novas oportunidades de caça para o falcão, como bacuraus, corujas e outras aves noturnas. A evidência do comportamento de caça noturna ilustra o quão bem adaptados estão os falcões ao ambiente urbano.

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Indivíduo fêmea em voo no centro de
Maringá/PR. Janeiro de 2014.
Foto:
Jéssica Araújo Carvalho
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Indivíduo descansando no alto de uma torre. Maringá/PR. Fevereiro de 2014.
Foto: Willian Menq

Procurando falcão-peregrino nas cidades
Se você mora em uma cidade grande com alguns edifícios é quase certo que nela habitem falcões-peregrinos. Se você pretende localizar um indivíduo e seus pontos estratégicos de caça e pouso, segue algumas dicas de Sávio Drummond:

"A partir de outubro fiquem atentos, especialmente entre 04:50h e 8:30h da manhã e entre 16:30h e 18:00h (antes de escurecer, na primavera e no verão daqui do Brasil); observem às torres de telefonia; às caixas de ar condicionado situadas em colunas/paredes laterais de prédios com mais de 9 andares e direcionadas para áreas espaçadas (ou pelo menos não dispostas para corredores muito estreitos com outros prédios), de preferência em paredes de prédios que possuam apenas as caixas, sem varandas ou janelas muito próximas; às torres altas de igrejas; às quinas e bordas dos terraços de prédios mais altos, especialmente próximo à lagoas e outros reservatórios naturais de água que possam existir numa área urbana; às sacadas de janelas pouco usadas e prolongamentos de sacadas ou estrutura semelhante constituindo planos horizontais em pontos altos dos prédios".

No ambiente urbano eles costumam usar esses locais como poleiros de caça, são aves bem fiéis aos locais de invernagem, ou seja, todos os anos retornam para a mesma região inclusive usam os mesmos poleiros. No centro urbano de Maringá/PR, em um raio de 5 km, já encontrei pelo menos seis indivíduos de falcão-peregrino, alguns usando torres de telefonia e caixas de ar-condicionado de prédios para passar o dia, enquanto outros ficavam escondidos no alto de edifícios.

Nas áreas rurais os peregrinos também podem ser observados, principalmente aquelas regiões com grande concentração de pombos-de-bando. Nesses ambientes eles costumam usar árvores altas como Eucaliptos e Araucárias como poleiros de caça e descanso. Estas árvores possuem uma configuração ideal para o falcão-peregrino: são altas, esguias e pouco frondosas, ideais para servir de poleiro e permitindo que o falcão tenha uma melhor visibilidade não muito interceptada por folhagem densa, como acontece em outras árvores (Drummond, 2010). No noroeste do Paraná, na área rural dos municípios de Peabiru e Londrina, já realizei uma série de observações de falcões-peregrinos usando araucárias (Araucaria angustifolia) ilhadas pela paisagem agrícola, como poleiro de caça. Normalmente os lugares onde o falcão-peregrino era avistado continham centenas talvez milhares de pombas-de-bando (Zenaida auriculata).

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Indivíduo no alto de uma torre de telefonia. Maringá/PR. Janeiro de 2014.
Foto: Willian Menq
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Indivíduo no alto de um edifício no centro
de Maringá/PR. Fevereiro de 2014.
Foto: Willian Menq

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Indivíduo descansando em uma caixa de ar-condicionado. Maringá/PR. Janeiro de 2014.
Foto: Willian Menq

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Indivíduo pousado na janela do último andar de um edifício. Maringá/PR. Janeiro de 2014.
Foto: Willian Menq


Em resumo, dicas para localizá-lo:
Época do ano: Final do mês de outubro até inicio de abril
Período do dia: Primeiras horas da manhã e finalzinho da tarde
Onde procurar: Nas cidades, através de um binóculo observar torres de telefonia, caixas de ar condicionado nos prédios, sacadas, torre altas de igreja, quinas e bordas e terraços de prédios.
Dicas: Fique atento a qualquer ave rápida de silhueta suspeita que voar pelos céus da cidade, ouça também o som dele na internet (clique aqui), pois poderá ouvi-lo vocalizando, voando pelos céus da cidade, brigando, defendendo território contra outros gaviões, ou mesmo quieto, empoleirado no alto de um edifício.

Espécies confundíveis:
O falcão-peregrino tem uma plumagem bem característica, possui dorso cinza-escuro quase negro, peito e abdome claro (varia do branco ao creme) todo barrado de cinza escuro, a cabeça e nuca também é cinza-escuro com uma faixa (parecendo uma lágrima) abaixo dos olhos. Visualizado de baixo, em voo, a melhor maneira de identificá-lo é observar a silhueta característica, peito claro com riscas escuras no ventre e faixa malar na cabeça, que em voo forma duas manchas de cada lado da cabeça, quase se encontrando com o pescoço. Pessoas com olhos menos atentos podem confundi-lo com outros falcões urbanos, espécies como o quiriquiri (Falco sparverius), falcão-de-coleira (Falco femoralis), o falcão-cauré (Falco rufigularis) são por vezes confundidos com ele.

Fique atento, a partir de outubro eles estarão chegando aos seus pontos regulares de invernagem, especialmente em áreas urbanas de todos os estados brasileiros. É sempre fascinante observar os falcões-peregrinos e entender um pouco mais da natureza comportamental dessas aves em temporadas de invernagem.

 

 

Citação recomendada:

Menq, W. (2015) O falcão-peregrino nas cidades - Aves de Rapina Brasil. Disponível em: < http://www.avesderapinabrasil.com/arquivo/artigos/falcao_peregrino_cidades.pdf > Acesso em: .



 

 
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